Catálogo Eliza Conde, 2000, coordenação da Patricia Veiga (OI!) e fotos da craquésima Isabel Garcia (ALÔ!)
Foi um dia muito agradável. Na parte da manhã, o encontro no ateliê da Barão da Torre, onde a artista (mangueirense e botafoguense ‘doente’)Thereza Miranda vive há 20 anos.
O material, super organizado (“Se não for, não pode se dedicar à profissão”, explica), assim como a enorme mapoteca
Antes morava/trabalhava na Urca. Nasceu na rua Ramon Franco, seu pai dono da segunda casa deste bairro fechado e familiar.
Fã de Vermeer e de Morandi. “Como é difícil achar postais deste pintor que tanto influenciou Scliar” comenta, cercada de quadros...
...e objetos familiares por todos os lados, como esta vitrine-minibar da ex-sogra, cheia de truques escamoteáveis
Nos porta-retratos sobre a mesinha lateral, suas verdadeiras jóias:
Os netos Marina e Fernando, filhos do Beto. Sua filha Sonia trabalha na Ong “ViverCidade” do Conde.
À tarde, checamos “Impressões” (2008), retrospectiva de sua trajetória artística, comemoração dos seus 80 anos. Thereza é intensa. Coleciona prêmios, fotos, gravuras, memórias, recordações, e, principalmente, AMIGOS.
Antes de entrarmos, um simpático almoço ao lado da loja “Novo Desenho” – “Você conhece o Tulio (Mariante)?” indaga -, onde fez um pit-stop para comprar um marcador de livros para... uma amiga, é claro!
Painel fotográfico: do coração para o ateliê
Amigos são parceiros de toda a vida. Entrou, não sai mais. Por isso 2000 deles foram abraçá-la no dia mais memorável de um vernissage no MAM. Este Museu - o mais bonito e imponente do Rio (projeto do Reidy) - nunca esteve tão lotado!
Estive lá, e posso afirmar que a fila parecia de lançamento de livro, onde o autor escreve sem demora uma dedicatória para cada comprador. Mas era apenas para desejar-lhe PARABÉNS (duplo) – um rápido abraço e logo ordenavam: próximo!
Por isso fez questão de listar (apenas pelo nome – ai de mim se não fosse meio ‘enturmada’!) sua equipe para a exposição: direção da Martha (Pagy), curadoria do Franklin (Pedroso), DVD do Dodô Brandão e do ‘Bigode’ (Luiz Carlos Lacerda). O design gráfico da expô e do catálogo, como sempre, coube ao ótimo Washington (Lessa – OLÁ!). Sem contar o inseparável Agustinho, seu impressor.
Vai tecendo comentários (elogiosos) sobre mais amigos: o Paulo (Herkenhoff – ex diretor do MoMA NY e do museu de Belas Artes Rio), a Rizza (Conde, com quem divide o ateliê de gravura Villa Venturoza, na Rua do Russell duas vezes por semana), Maria Silvia (Bastos Marques – presidente da Icatú Hartford), Ana e Zé (da Glatt, onde ela emoldura suas obras). Dos amigos da profissão menciona Maria do Carmo (Secco), Anna Bela (Geiger), Renina (Katz), Amador (Perez), Marília (Kranz), Lygia Pape...(Bem, essa ela citou com nome E sobrenome porque tem também a Clark, né?)
Ao amigo Gilberto (Chateaubriand) não negaria o local, onde estudou gravura em metal, posteriormente lecionando a técnica – foram 12 anos no belo Aterro do Flamengo. Há mais de 30 anos dá aulas na PUC, também colecionando alunos, que a cumprimentam com especial deferência ao encontrá-la. Obs: Uma das suas inúmeras alunas foi a Valéria Costa Pinto , que também já deu entrevista para o site.
“Como seria de se esperar, Thereza tem o toque inconfundível de inteligência e sensibilidade. Mas o que mais nela me comove é a amizade que nos une”, aponta Gilberto. Perspicaz ele, não?
As palavras do Chateaubriand que mais a emocionaram abrem num painel a mega homenagem. “Só do Scliar ele tem mais de 40 quadros”, relata.
Mas o que me ‘matou’ de inveja foi um poema do Drummond (ainda bem que ela não o chamou de "Carlos”, porque aí eu ‘morreria’ mesmo) lhe dedicou - sem nem ao menos conhecê-la - quando viu suas gravuras na Galeria Bonino.
Fala com alegria da sua obra - “nada de inspiração, é trabalho duro mesmo” -, mas acaba relatando a influência das raízes no início da carreira de gravadora na déc.60 – “Germinação” - e posteriormente na “Nova Germinação”, onde já afloravam as mandalas, que se apresentaram mais nítidas na déc.70, na fase que chamou “Germinação – Vida”.
Germinação Vida XV, 1973 água-forte, água tinta e relevo
Apaixonou-se pela fotogravura, técnica que aprendeu em Londres ao ganhar uma bolsa do British Council em 1974. “Tudo aconteceu por causa de um esbarrão na rua...”. E lá vem Thereza com mais uma das suas histórias fantásticas.
O imenso orgulho ao ver sua gravura publicada na capa da revista-referência londrina...
Em 1977, cursa litografia na University of New Mexico, para logo depois em Nova York se aperfeiçoar no metal com Roberto De Lamonica e fotogravura no importante Pratt Institute. Obs: Deste Instituto, conheço o campus do Brooklyn, onde meu filho mora e trabalha, recentemente acrescido de um anexo para arquitetura, projeto do badalado Steven Holl. LIN-DO!
Seguiram-se as viagens – Bolívia, Machu Picchu, Ilha da Páscoa, Minas, Maranhão...’fotogravando’ cada imagem retida na retina.
Alcântara, fotogravura e água tinta, 1979 Esta é uma das minhas. Arquitetura, lógico!
A influência pelo gosto em retratar casarios ela deve ao escritório do grande arquiteto Henrique Mindlin, companheiro de trabalho até sua morte (1971), quando foi contratada pelo Aloísio (Magalhães), o pioneiro escritório de design gráfico no Brasil.
Thereza no lançamento do livro "Reinações" (Chácara do Céu - 2008) de José Mindlin (hoje com 94 anos), seu amigo e colecionador, irmão de Henrique. Foto da amiga Bia (Sasso)
Aliás, arquitetos sempre fizeram parte da sua ‘praia’ – da ‘turma da praia’, literalmente - como Accioly , na déc.80. “É a minha Tereza da praia Se é tua é minha também” Pergunto-lhe se ela foi a inspiração de Tom ao escrever “Tereza da praia”. “Nããão”, responde prontamente, afirmando que era Tereza Hermany, sua primeira mulher. Já a musa inspiradora de “Lígia” também é sua amiga - a diretora da Casa de Cultura Laura Alvim, Lygia Marina de Moraes.
Na área musical, minha entrevistada mostrou especial apreço pela Bethânia.
“Ela é muito tímida. Gosta de conviver apenas com os mais chegados”, relata com certo orgulho.
Do meio teatral, as melhores lembranças recaíram sobre a Fernanda (Montenegro). “Ela me telefonou dizendo que não poderia ir à inauguração por causa do Fernando, mas veio no sábado e almoçamos apenas um sanduíche. Seu próximo projeto será contracenar com o Sérgio (Britto) nos papéis de Simone de Beauvoir e Sartre.” Contou-me então como conheceu a “Grande Dama”, no tempo em que ambas estavam apenas no início de carreira. Na Churrascaria Carreta, um amigo comum as apresentou. A atriz confidenciou-lhe que em termos de Arte, possuía apenas fotos dela emolduradas que saíam nas revistas. Thereza garantiu-lhe que, se um dia realizasse o sonho de se tornar gravadora, a presentearia com um trabalho seu. Fernanda respondeu-lhe que, se isso ocorresse, cobriria sua casa de flores. Dez anos depois Fernanda estrelava “Assim é se lhe parece” (Pirandello) quando... as duas cumpriram suas respectivas promessas e se tornaram ‘amigas para sempre’.
Na déc.90, com o declínio do valor do papel, a artista voltou-se para a pintura (tinta acrílica sobre tela), com pinceladas ligeiras e esfumaçadas. Primeiro surgiram os tons verdes de florestas e matas...
Floresta da Tijuca, 1994
... para logo a seguir ir mergulhando em mares e águas azuis da nossa tão pródiga natureza:
A grande onda, 1996
Depois de expor na déc. de 80 na Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa, assumiu em 1993 a direção do Centro de Artes desta Instituição (Secretaria de Cultura RJ), onde permaneceu até 2000, e claro - pra variar -, fazendo um belo e sério trabalho.
Na virada do século - sem abandonar o filão da pintura e o tema da paisagem - retorna gloriosa às gravuras, surpreendentemente bonitas, com cores fortes e quentes nos seus nítidos contornos.
Dois irmãos e Pedra da Gávea fotogravura, água-forte e água-tinta
“Você conhece o Albertina?”, pergunto-lhe para encerrar, como se ela, que conhece absolutamente tu-do do seu métier, pudesse não saber tu-do sobre este magnífico ‘museu do papel’ em Viena.
Bem, sabe qual o meu maior desejo depois desta entrevista? Que Thereza me coloque no seu painel e conte para uma jornalista: “Esta é a minha amiga Ignez, que fez uma looonga entrevista comigo, sem fazer nenhuma anotação!" (E por isso mesmo esqueceu inúmeros amigos citados...sorry a todos, pois Thereza não se esqueceu de nenhum!)
A amiga RIZZA homenageia THEREZA em 1997 com a medalha Pedro Ernesto, pelo seu trabalho à frente do Gulbenkian . Para mim, acho que foi o mérito pela dedicação de toda uma vida artística e acadêmica .
BRAVO! |